OAS,
Camargo Corrêa e Odebrecht contribuíram com as campanhas de
pelo menos oito membros da comissão de investigação da
Assembléia Legislativa de São Paulo. Empresas integram consórcio
responsável pela Linha 4 do metrô.
Maurício
Reimberg - Carta Maior
SÃO
PAULO - A Assembléia Legislativa de São Paulo (Alesp) está
investigando os detalhes da contratação das empreiteiras que
compõem o Consórcio Via Amarela, responsável pelo desastre
na Linha 4 do metrô paulistano. Uma curiosidade salta à
vista: vários deputados da comissão responsável pelos
trabalhos receberam doações financeiras daquelas
construtoras na última campanha eleitoral. São todas doações
legais e os dados estão disponíveis nas prestações de
contas junto ao TSE.
Pelo
menos oito dos 21 parlamentares da comissão foram
beneficiados com um total de R$ 810 mil das empresas do Consórcio.
Trata-se da OAS, Camargo Corrêa e Odebrecht.
Dos
oito, quatro integram a base governista: Orlando Morando
(PSDB), vice-presidente da Comissão de Obras e Serviços Públicos,
Arnaldo Jardim (PPS, agora eleito deputado federal),
vice-presidente da Comissão de Transportes e Comunicações,
Roberto Morais (PPS) e Jorge Caruso (PMDB). A oposição tem
também quatro representantes que receberam dinheiro: Sebastião
Arcanjo (PT, não reeleito), presidente da Comissão de Obras
e Serviços Públicos, José Zico Prado (PT), Simão Pedro
(PT) e Adriano Diogo (PT).
Situação
e oposição
Apesar
da coloração partidária indicar um possível equilíbrio
político, quem mais arrecadou foram os governistas. O
deputado que recebeu a contribuição mais expressiva foi
Jorge Caruso (PMDB), da Comissão de Transportes e Comunicações.
Ele arrecadou R$ 200 mil das empreiteiras. O valor representa
57% do total recebido pelo parlamentar, que teve R$ 349,89 mil
como receita bruta de campanha.
Orlando
Morando (PSDB) recebeu R$ 150 mil da OAS. Arnaldo Jardim (PPS)
arrecadou R$ 50 mil da Camargo e R$ 100 mil da OAS. Por último,
Roberto Morais (PPS) obteve R$ 40 mil da Camargo Corrêa. No
total, a bancada ligada ao palácio dos Bandeirantes recebeu
R$ 540 mil.
A
ala petista arrecadou R$ 270 mil no total, assim divididos:
Adriano Diogo R$ 140 mil (R$ 90 mil da Camargo Corrêa e R$ 50
mil da OAS), José Zico Prado R$ 90 mil da Camargo Corrêa,
Simão Pedro, R$ 20 mil da Braskem (Odebrecht) e Sebastião
Arcanjo R$ 20 mil da Braskem (Odebrecht).
Criada
para apurar o motivo dos sucessivos acidentes na Linha 4 do
Metrô paulista, a comissão de representação é organizada
em torno dos sete membros efetivos das comissões permanentes
de Serviços e Obras Públicas e nove originários da
Transportes e Comunicações. Além dos 16 deputados,
completam o bloco cinco representantes das bancadas não
contempladas: PV, PDT, PSC, PRB e PP, que têm um grau de
influência reduzido sobre os rumos das investigações.
Sem
CPI
A
criação da comissão especial foi resultado de uma recusa. O
presidente da Assembléia, Rodrigo Garcia (PFL), se negou a
atender um pedido do PT, que reivindicava a instauração de
uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) na Alesp. Pelo
acordo de líderes, as CPIs são criadas pela ordem cronológica,
e o pedido teria que passar à frente de todos os 69
requerimentos protocolados na Casa, herança da relação do
Legislativo com o Executivo no período Alckmin.
A
Mesa Diretora, que venceu a queda de braço pela não instalação
da CPI, ostenta três membros que receberam doações das
empreiteiras do Consórcio Via Amarela. O presidente Garcia
(PFL) recebeu R$ 12 mil, Fausto Figueira (PT), 1º Secretário,
R$ 20 mil e Geraldo Vinholi (PDT), 2º Secretário, R$ 50 mil.
Quem
contribuiu
A
principal fonte financeira dos deputados que integram a comissão
foi a OAS, que doou quase metade do total. Na operação, o
conglomerado baiano gastou R$ 400 mil reais. Procurada pela Carta
Maior, a empresa não quis comentar sua estratégia política
ou seus interesses na Assembléia. A OAS também não divulgou
nenhuma nota oficial sobre o tema.
Já
Ana Paiva, assessora de imprensa do grupo Camargo Corrêa,
esclarece que "a empresa parte do pressuposto de que
todas as doações foram feitas estritamente de acordo com os
princípios que a legislação permite". A Camargo Corrêa
foi o segundo braço do Consórcio que mais investiu, com R$
370 mil em doações eleitorais aos membros da comissão.
A
Obebrecht fecha a planilha, com R$ 40 mil aplicados naqueles
parlamentares. Já a Queiroz Galvão e a Andrade Gutierrez, as
outras duas sócias no Via Amarela, não fizeram contribuições
financeiras a nenhum dos deputados que agora fiscalizam as
empresas.
O
grupo Andrade Gutierrez, em nota oficial enviada à Carta
Maior, defende o atual modelo de financiamento.
"Acreditamos que doações às campanhas políticas
feitas dentro das regras institucionais são parte integrante
do processo democrático. O grupo AG sempre se relacionou com
as diferentes esferas de governo de forma transparente",
afirma a nota.
As
listas divulgadas pelo Tribunal Superior Eleitoral não
revelam todas as empresas doadoras da campanha eleitoral. Além
de pulverizar as doações entre as diversas subsidiárias,
como é o caso da Braskem, holding petroquímico da Odebrecht,
algumas empresas não deixam evidentes suas contribuições.
Há
duas formas legais de doar recursos sem ser totalmente
transparente. A empresa pode fazer a doação para o partido
do candidato, e orientar o repasse do valor para o seu
preferido. A outra possibilidade é financiar uma instituição
que represente determinado setor para fazer as doações
recomendadas.
Agora,
a comissão tem até o dia 14 de março, quando se encerra a
atual legislatura, para concluir o relatório. Embora não
tenha status de CPI, a comissão pode pedir documentos e
convidar autoridades, mas não pode solicitar a quebra de
sigilos bancário e telefônico.
Falam
os deputados
Carta
Maior buscou ouvir alguns dos deputados que receberam doações
das empreiteiras. A reportagem indagou se haveria algum
conflito ético por suas campanhas terem sido parcialmente
financiadas por empresas a quem devem investigar. As respostas
seguem abaixo.
Deputado
Orlando Morando (PSDB):
"Não
existe conflito ético de forma alguma. A OAS é a construtora
que mais ergue supermercados no Brasil. Sou vice-presidente da
Associação Paulista de Supermercados (APAS) e tenho vínculos
com o setor. Sou dono de um estabelecimento. A doação foi
intermediada por Sussumu Honda, que pertence à Diretoria
Executiva da Associação Brasileira de Supermercados (ABRAS).
Sinto-me à vontade no campo ético. Fui o primeiro deputado a
aparecer no local do acidente e questiono o modelo do contrato
com as empreiteiras. A doação não influencia nada no
aprofundamento dos trabalhos. Temos procedimentos que podem
oferecer uma boa investigação, sem necessidade de uma
CPI".
Adriano
Diogo (PT):
"Quando
recebi esse dinheiro, não tinha feito nenhuma troca de
favores com as empresas do Consórcio Via Amarela. Quem tem de
dar satisfação é o governo do Estado. Acho errado chamar
empreiteira para depor. Sou contra. Deputado tem que se
relacionar com o governo. O Consórcio só faz o que o
contratante manda. Essas empresas contribuíram comigo porque
era uma doação para o PT. Fazendo uma analogia, é como se,
a partir de um determinado dia, quando entrasse em vigor o
financiamento público de campanhas, os deputados não
tivessem mais condições de investigar o poder público.
Agora, talvez eu seja um cara honesto e isso seja interessante
para o nome delas (Camargo Corrêa e OAS) não ficar
sujo".
Carta
Maior entrou em contato várias vezes com a assessoria de
Jorge Caruso, o parlamentar que mais arrecadou entre os
citados. Uma entrevista foi prometida. Até o fechamento desta
edição, ele não retornou as ligações.