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Por
um bairro jardim
LUIZA NAGIB ELUF
A cidade de
São Paulo teve um crescimento tão rápido e
desordenado que se transformou num espetáculo de
horrores
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A CIDADE de São Paulo teve
um crescimento tão rápido e desordenado que, em termos urbanísticos,
se transformou num espetáculo de horrores.
Além dos transtornos
causados por enchentes, alagamentos, deslizamentos,
engarrafamentos, poluição de todas as espécies, falta de água,
de luz e até de ar, falta de espaço para circulação (a pé
ou de carro) e escassez de áreas de lazer públicas, as
edificações da cidade adquiriram feições extremamente
antiestéticas: ou são lojas do tipo "caixote", ou
casas geminadas sem jardim, ou torres altas e desproporcionais
aos terrenos.
Sem mencionar as favelas, os
moradores de rua e todas as questões envolvendo o déficit
habitacional. Nada disso existiria se tivesse havido um melhor
planejamento urbano e ambiental, bem como investimentos em
infra-estrutura e saneamento básico. Nem tudo, porém, está
perdido.
Sobraram, para nossa sorte,
os bairros-jardim, planejados e loteados pela companhia City
of São Paulo no início do século passado e que demonstram
antevisão ambiental extraordinária, fruto do trabalho do
arquiteto inglês Berry Parker.
Alguns desses bairros foram
tombados, outros se encontram em processo de tombamento, como
o Alto da Lapa, também conhecido como "City Lapa",
onde a horizontalidade da ocupação permite a circulação de
ventos que arejam os locais próximos ao centro expandido,
amenizando os efeitos dos fenômenos climáticos das ilhas de
calor. As grandes áreas verdes, que garantem a permeabilidade
do solo, são de inestimável serventia para a absorção das
águas pluviais e o controle das enchentes.
O Alto da Lapa, além de
proporcionar uma valiosa contribuição à estética verde da
cidade de São Paulo, é rota de inúmeras espécies de pássaros
-cujas presenças configuram um indicador de qualidade de
vida- que aí se abrigam, se aninham, procriam.
Todo esse patrimônio histórico,
cultural, ambiental, paisagístico, arquitetônico, botânico
e biológico -que já foi objeto de estudo de especialistas da
qualidade de Aziz Ab'Saber, Candido Malta Campos Filho,
Elizabeth Höfling e Ana Maria Giulietti- está correndo sério
risco de descaracterização, com o conseqüente
desaparecimento de um dos pulmões da cidade.
Em decorrência de restrições
impostas pelo loteador e pelo zoneamento, é proibida a
construção de prédios de habitação coletiva no miolo
residencial do Alto da Lapa. Não obstante, algumas
construtoras insistem em querer erguer empreendimentos
gigantescos no bairro, desrespeitando as regras proibitivas e
as necessidades de uma metrópole triste, caótica e
insalubre.
Por essa razão, os moradores
do Alto da Lapa se organizaram em associação e foram
obrigados a ingressar com processos administrativos e
judiciais para garantir a preservação do bairro, da
qualidade de vida, das espécies animais e vegetais.
No entanto, a morosidade da
Justiça e a insensibilidade de alguns podem fazer com que décadas
de zelo ambiental e urbanístico se percam. É preciso
reconhecer que, graças ao Ministério Público do Estado de São
Paulo, à Justiça paulista, ao STJ (Superior Tribunal de
Justiça) e ao STF (Supremo Tribunal Federal), muito estrago
se conseguiu evitar. Obras irregulares foram embargadas, serviços
públicos foram regularizados, propinas foram desmascaradas,
poluidores foram obrigados a usar filtros, praças foram
recuperadas.
Atualmente, a Prefeitura de São
Paulo também vem colaborando, mas, acima de tudo, é a
mobilização incansável de moradores a grande responsável
pela preservação da área.
E, no presente momento, eles
estão precisando do apoio e da compreensão dos poderes
constituídos, principalmente do Poder Judiciário, a quem
cabe a última palavra de salvação ou de destruição desse
patrimônio de incomensurável valor, não apenas urbanístico
mas, sobretudo, ambiental.
LUIZA NAGIB ELUF é
procuradora de Justiça do Ministério Público do Estado de São
Paulo. Foi secretária nacional dos Direitos da Cidadania do
Ministério da Justiça (governo Fernando Henrique Cardoso).
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